Por ser mais comum, logo que falamos em anemia pensamos em anemia por falta de ferro, a chamada anemia ferropriva.
No entanto, existem várias causas e tipos de anemia:
- Anemias carenciais (além da falta de ferro, falta da vitamina B12 e ácido fólico);
- Anemias por defeito da membrana (esferocitose hereditária, eliptose hereditária etc);
- Anemias por deficiências de enzimas eritrocitárias ( deficiência de G6PD, deficiência de piruvato quinase);
- Anemias hemolíticas adquiridas imunes e não imunes (anemia hemolítica microangiopática, por prótese valvar cardíaca, malária, hemoglobinúria paroxística noturna etc);
- Anemia por falência medular (aplasia medular, mielodisplasia etc);
- Anemia da doença crônica (doenças inflamatórias, doença renal, hipotireoidismo etc);
- Talassemias e hemoglobinopatias.
Ufa! Como visto acima, o diagnóstico diferencial das anemias é vasto e nem sempre é simples definir a causa.
Hoje escolhi falar um pouco sobre as talassemias, principalmente por elas serem muito confundidas na sua forma minor/ ou traço com a anemia ferropriva. Vamos lá!
AS TALASSEMIAS
As talassemias são um tipo de anemia hereditária, isto é, passada dos pais para os filhos. Para entendê-las é preciso conhecer o que são as hemoglobinas.
Hemoglobinas são proteínas que compõem os glóbulos vermelhos e elas têm como função levar o oxigênio dos pulmões para as células do nosso corpo funcionarem.
Cada molécula de hemoglobina é composta por 2 cadeias de globina alfa (α) e duas cadeias de globina não alfa, unidas por um átomo de ferro.
A produção dessas globinas é regulada por genes situados no cromossomo 16 (globinas α) e no cromossomo 11( globinas β). As talassemias são um grupo heterogêneo de doenças genéticas causadas em suas formas mais comuns pela redução da globina alfa (talassemia alfa) ou beta (talassemia beta).
E damos o nome à manifestação da redução dessa produção de ERITROPOESE INEFICAZ, que é a destruição dos glóbulos vermelhos mais jovens ainda na medula óssea (onde é produzido o sangue), levando ao quadro de anemia. Quanto mais intenso esse processo de eritropoese ineficaz, mais grave é a anemia manifestada.
A TALASSEMIA ALFA está presente principalmente no Sudeste Asiático, Oriente Médio e África Subsaariana. No Brasil a prevalência é variável e pode chegar a 20% da população.
A talassemia alfa, dependendo do número de genes acometidos com a diminuição de produção de globina alfa, pode se manifestar das seguintes formas: portador silencioso, traço alfa talassêmico, doença da hemoglobina H e hidropsia fetal.
A TALASSEMIA BETA é uma alteração genética muito prevalente nas regiões banhadas pelo Mar Mediterrâneo. No Brasil a prevalência é de 0,7%, mas pode chegar a 5% em locais de colonização italiana.
A forma menor - beta talassemia minor, é heterozigota (isto é, a pessoa recebeu somente um gene alterado, ou do pai ou da mãe), e geralmente é assintomática, com discreta anemia que não requer tratamento. Nesses casos o portador de talassemia minor deve estar consciente de que pode passar o gene alterado para seu filho e no caso de seu companheiro (a) ter também talassemia minor, existe uma chance de 25% de a criança nascer com a forma grave da talassemia (major) que exige tratamento para a vida toda.
A beta talassemia major é a forma homozigota da talassemia (isto é, quando a pessoa recebeu 2 genes alterados - um do pai e outro da mãe) e se apresenta com intensa eritropoese ineficaz, que por sua vez implica em anemia acentuada, requerendo transfusões frequentes. Além disso, outras manifestações clínicas podem ocorrer como deformidades ósseas, déficit de crescimento, alterações endocrinológicas etc.
O elevado número de transfusões, além do aumento da absorção de ferro pelo intestino, podem levar a uma sobrecarga de ferro com danos ao coração e ao fígado, se não tratada.
Já a forma intermediária da talassemia beta tem um quadro clínico discretamente mais intenso que o da talassemia minor, mas não tão grave quanto ao da talassemia major.
É importante saber que mesmo no caso da beta talassemia major, se a pessoa receber um suporte transfusional adequado e fizer o tratamento medicamentoso para retirar o excesso de ferro das transfusões, ela pode levar uma vida normal.
Atualmente, através do teste do pezinho, a talassemia pode ser diagnosticada precocemente e seu tratamento nas formas mais graves iniciado sem demora.
Nas formas assintomáticas o diagnóstico demora um pouco mais para se estabelecer. Como o hemograma mostra alterações que se confundem com a falta de ferro, é bem comum a pessoa referir que tem uma anemia que trata com sulfato ferroso desde a infância e não melhora nunca. Exames como a eletroforese de hemoglobina, pesquisa de hemoglobina H, citologia, são ferramentas importantes para o diagnóstico. Nos casos mais difíceis podem ser necessários métodos de biologia molecular.
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